Atualidade do cancro do pulmão

Benefícios da Cessação Tabágica, Tipos de Intervenção

De acordo com a OMS, o tabaco mata mais de 8 milhões de pessoas por ano. Mais de 7 milhões dessas mortes são o resultado do uso direto do tabaco, enquanto cerca de 1,2 milhões são o resultado da exposição ao fumo passivo. Mais de 80% dos 1,3 biliões de fumadores no mundo vivem em países subdesenvolvidos onde o impacto das doenças e mortes relacionadas com tabaco ainda é mais grave.

O tabagismo está associado a várias patologias crónicas, nomeadamente, doença respiratória, cardiovascular, diabetes e cancro, entre outras não esquecendo, nomeadamente a Covid-19 em que os fumadores têm um risco acrescido de desenvolver doença grave e morte. A Organização Mundial de Saúde (OMS) pediu a todos os países que criem ambientes livres do tabaco que forneçam as informações, o apoio e as ferramentas necessárias para a eficácia da cessação tabágica.

As medidas legislativas de restrição de fumar em locais públicos a intervenção a nível dos jovens para evitar a iniciação e a promoção da cessação tabágica são as medidas mais eficazes para evitar esta epidemia.

A abordagem dos hábitos tabágicos e intervenção a nível de todos os fumadores deve fazer parte da prática clínica diária.

A maior parte dos fumadores adultos conhece os riscos e gostaria de deixar de fumar, mas sem ajuda só menos de 7% consegue ficar abstinente ao final de um 1 ano.

A intervenção em cessação tabágica é fundamental não tem de ser necessariamente demorada uma intervenção breve pode ser eficaz se o fumador estiver motivado. Esta intervenção será mais efetiva se tivermos em conta o perfil do fumador:

Fumadores jovens:

Os estudos mostram que a maioria dos jovens fumadores não entende os riscos específicos do uso do tabaco pelo que a intervenção a nível dos jovens deve centra- se especialmente nas vantagens em deixar de fumar. Têm de ser mensagens claras e objectivas, por exemplo explicar-lhes que a pele fica muito mais luminosa, que há uma melhoria significativa quer da performance desportiva, quer da sexual (realçando o facto de que o tabaco é um dos factores principais de impotência nos jovens).

Nos jovens portadores de asma explicar-lhes que a cessação tabágica é fundamental para o controlo da sua doença. O tabaco exacerba as queixas nomeadamente de tosse, pieira, cansaço e interfere a nível do mecanismo de acção dos corticóides diminuindo a sua eficácia e contribuindo par um mau controlo da doença. A cessação tabágica vai obviamente melhorar esta situação.

Nos jovens diabéticos explicar–lhes que o tabaco é um dos factores de agravamento da glicemia e do não controlo da diabetes.

A demonstração das vantagens associada a um bom apoio a nível comportamental são os factores essenciais para a cessação nos jovens. A maior parte não necessita de terapêutica farmacológica.

Mulheres fumadoras:

As mulheres são mais dependentes da nicotina pelo que necessitam de uma intervenção mais intensiva. É muito importante alertar para os riscos específicos do género feminino nomeadamente:

– O aumento do risco tromboembólico em associação com a pílula, e nesta altura de pandemia em que tanto se fala do risco tromboembólico em relação às vacinas covid-19, esquecemo-nos deste risco.

– A infertilidade, o aumento da incidência de cancro do colo uterino nas mulheres colonizadas com HPV.

– O risco de uma menopausa precoce com repercussão na diminuição da densidade óssea e maior probabilidade de fraturas.

– Alertar na gravidez para o maior risco de aborto espontâneo, de placenta prévia, parto prematuro, hemorragias, morte fetal RN de baixo peso.

É da responsabilidade do profissional de saúde alertar para os riscos, mostrar as vantagens e incentivar a cessação tabágica. Muitas vezes não há necessidade de referenciar para uma consulta especializada. A intervenção breve pode ser suficiente se as mensagens forem claras, objectivas e se houver empatia entre médico e doente.

Doentes crónicos:

Nos doentes crónicos, nomeadamente nos doentes portadores de Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC), doenças cardiovasculares e diabetes, a cessação tabágica deve fazer parte integrante do seu tratamento. Este tipo de doentes muitas vezes necessita de uma intervenção intensiva, que inclua apoio farmacológico e psicológico.

Doentes com cancro do pulmão:

A cessação tabágica deve ser parte integrante do tratamento do doente oncológico. Cerca de metade dos doentes continua a fumar após o diagnóstico de cancro.

As dificuldades encontradas na cessação tabágica no doente oncológico são principalmente o stress e a ansiedade causados pelo impacto do diagnóstico, a vivência da doença e os tratamentos a que têm de ser sujeitos, assim como as expectativas quanto ao futuro, o receio da recaída e os baixos níveis de auto-confiança, o impacto da doença a nível familiar e profissional e muitas vezes o sentimento de culpa por não ter deixado de fumar.

Na maior parte dos casos, os membros fumadores do agregado familiar, mantêm os hábitos tabágicos, o que vai dificultar ainda mais o processo de cessação tabágica no doente. De modo a evitar esta situação, o agregado familiar deve ser envolvido e, se houver fumadores, estes também devem ser aconselhados a entrar num programa de cessação tabágica.

Os profissionais de saúde têm obrigação de incentivar os seus doentes oncológicos a abandonar os hábitos tabágicos e a incluí-los num programa de cessação tabágica.

O apoio deve ser feito por uma equipa multidisciplinar e deve abordar a dependência física e psicológica, alertar para os riscos de continuar a fumar e mostrar os benefícios da cessação.

Os fumadores devem ser informados das várias terapêuticas disponíveis, nomeadamente as terapêuticas a nível farmacológico e a nível comportamental.

Os doentes portadores de cancro do pulmão são mais dependentes da nicotina, o que implica um maior esforço, com um plano terapêutico mais agressivo, muitas vezes com necessidade de associações terapêuticas, e com uma duração de tratamento mais prolongado, entre 6 a 12 meses.

Os benefícios da cessação tabágica no doente portador de cancro do pulmão estão devidamente identificados e estudados:

A cessação tabágica aumenta a qualidade de vida e a eficácia do tratamento nomeadamente o tratamento cirúrgico, reduzindo o risco de complicações operatórias, recidiva e o aparecimento de segundos tumores.

De acordo com uma metanálise publicada no British Medical Journal a cessação tabágica no doente portador de cancro do pulmão em estadio inicial, aumenta a sobrevivência em 15 a 20% dos doentes aos quais lhe é diagnosticado um cancro em estadio I a IIIA. A sobrevivência aos 5 anos daqueles que mantém os hábitos tabágicos é cerca de 33%. No grupo que suspendeu os hábitos tabágicos, a sobrevida aumentou para cerca de 70%. Outro estudo avaliou o custo-efectividade de um programa de cessação tabágica antes da cirurgia de ressecção pulmonar, ao fim de um ano e após 5 anos. Concluíram que existem vantagens significativas: diminuição do risco de doença, aumento do tempo de sobrevida, diminuição das complicações pós-operatórias, aumento da eficácia da quimioterapia, diminuição das complicações da radioterapia e aumento da qualidade de vida.

A importância da cessação tabágica no prognóstico e na qualidade de vida do doente portador de cancro do pulmão está devidamente documentada em Oncologia mas não é muito clara para os fumadores, daí o papel importante dos profissionais de saúde no esclarecimento das dúvidas e receios do doente portador de cancro do pulmão.

Dra. Lourdes Barradas
Assistente Senior em Pneumologia
Directora do Serviço de Pneumologia do Instituto Português de Oncologia de Coimbra (IPOCFG)
Responsável do Grupo de Decisão Terapêutica de Tumores Torácicos do IPOCFG
Responsável da Consulta de cessação Tabágica do IPOCFG
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